A Espada sobre Rodas

O brasileiro só conheceu réplicas de carros antigos nas décadas de 70 e 80. Aqui foram produzidos os MP Lafer, cópias do MG TD, o Bugatti 35 e o Alfa Romeo 1931 todos com motor Volkswagen a ar. O MP agradou bem mais que seus concorrentes. Outro foi o MG TF 1954 do piloto Antonio Carlos Avallone que era mais fiel e tinha motor GM Chevette na dianteira. Esbanjava muito pelo tamanho e imponência era o Concorde (abaixo) com motor Ford V8 vindo do Galaxie nacional. Esta já era inspirada em carrocerias de carros americanos principalmente no Duesenberg  de 1933.

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No resto do mundo também não faltaram réplicas, mas a história da Excalibur é muito interessante. Nos meados da década de 60 a Studebaker americana estava em péssima situação financeira. Alguns de seus modelos eram muito ultrapassados outros nem tanto como o Avanti desenhado pelo francês Raymond Loewy.

Queriam uma última tentativa para tentar tirar a empresa fundada em 1852 da falência iminente. Um fato muito interessante era que desde 1958 a empresa de South Bend, localizada no Estado de Indiana era representante e distribuidor da Mercedes-Benz alemã. Entregaram a tarefa de criar um automóvel bem distinto, um carro digno de impacto, com estilo antigo e famoso ao reputado designer Brook Stevens que além do Studebaker Gran Turismo Hawk já havia projetado tratores, motocicletas e até eletrodomésticos. Seu orçamento era curto e ele iria fazer um milagre sobre o chassi do Studebaker Lark Daytona. Devido às circunstâncias financeiras ruins o carro não foi apresentado no Salão de Nova York em 1963 e para piorar, deixaram Stevens sem apoio. Já com todo o ferramental pronto ele não hesitou em pedir ajuda aos bancos e a  General Motors que lhe cederia o motor do esportivo Corvette e em 1965 foi apresentado o espetacular Excalibur. O nome muito bem escolhido é o da famosa e lendária espada do Rei Arthur que também é um personagem lendário da velha Inglaterra do século VI.

O belo automóvel tinha o desenho baseado no famosíssimo Mercedes-Benz SS e 540 K produzidos entre o final da década de 20 e começo da de 30. Estritamente para duas pessoas o esportivo com para-brisas plano podia receber uma capota de lona e bagageiro cromado que protegia o pneu sobressalente que era afixado atrás sobre a tampa do falso porta-malas. Muito bonito chamava a atenção seus para-choques cromados, belas rodas raiadas que usavam pneus 7.75 x 15 e três canos de descarga de cada lado também cromados que saiam do capô na frente e iam até o eixo traseiro. Sobre o capô havia ainda entradas de ar e podia vir ornamentado com uma grossa correia.

Na frente a grade do radiador também chamava atenção por ser grande e pelo mascote que era uma mulher de braços abertos inseridos num arco de metal. De longe poderia ser confundido com o Benz da década de 20. Havia três faróis circulares de bom, tamanho, sendo um no meio, apoiados em uma estrutura de tubos. Atrás o pára-choque era discreto assim como as pequenas lanternas.

Difícil não notar sua presença, o Excalibur SS media 4,25 metros de comprimento, 2,77 de entre-eixos, 1,70 de largura e apenas 1,19 de altura. Seu peso era de 1.080 quilos. A carroceria era em fibra de vidro apoiada em chassi com longarinas de aço.

Sua suspensão era independente na frente, com desenho em trapézio, usava molas helicoidais, barra estabilizadora e amortecedores telescópicos. Atrás usava eixo rígido, feixe de molas semi-elípticas e braços longitudinais. Seus freios dianteiros eram a disco e atrás a tambor. Era produzido em Milwaukee, no Estado do Wisconsin.

Seu motor era dianteiro, refrigerado a água com oito cilindros em “V” a 90º. Tinha 5.345 cm³ (101,6 x 82,55 mm) de cilindrada, a taxa de compressão era de 10,5:1 e sua potência era de 305 cavalos a 5.000 rpm. O torque generoso era de 49,7 mkg.f a 3.200 rpm e era alimentado por um carburador de corpo quádruplo da marca Carter. Sua tração era traseira e tinha a disposição um cambio de quatro marchas mecânico ou o Powerglide automático com duas velocidades. Sua velocidade máxima era de 185 km/h e fazia de 0 a 96 km/h em apenas 5,4 segundos números que podem ser considerados  ótimos devido a uma aerodinâmica de outra época. Também não era um carro para se dirigir esportivamente. Era para desfilar e não demorou muito para surgirem clientes como artistas da música e do cinema como Frank Sinatra, Steve MacQueen e Tony Curtis. Era também apreciado por poderosos de Las Vegas e milionários do petróleo do Oriente Médio.

Por dentro tinha acabamento primoroso. Os bancos tinham apoio de braço central, eram em couro assim como a forração das portas, do porta-luvas e do painel. Este tinha instrumentos circulares em número de seis com desenho imitando os da época antiga. O volante tinha aro de madeira e desenho esportivo e moderno destoando um do resto já que as maçanetas internas também imitavam o desenho antigo. Custava na época 7.450 dólares, ou seja, o dobro de um Dodge Charger ou de um Morgan que poderia ser considerado um concorrente.

Em 1966 entrava em cena o modelo Phaeton SS com quatro lugares e por este motivo a capota de lona era maior e com linhas bem retas. Com a traseira bem vertical o pneu reserva era alojado no para-lama direito. O acesso dos passageiros aos bancos de trás não era nada bom e o espaço também ficava um pouco a dever. Visto de lado perdia um pouco o tom nostálgico já que a frente muito grande destoava do conjunto assim como os pneus muito largos.

Em 1970 já haviam sido fabricados 386 modelos e entrava a série II com ligeiras modificações nos para-lamas. O chassi do Lark era abandonado e um novo um pouco maior era desenhado pela fábrica reforçado em forma de “X”. Outra novidade era o capô em chapa de alumínio. Também mudava o mascote. Dentro do arco de metal  estava a famosa espada do Rei inglês. A suspensão passava a ser do Corvette e o motor passava a ter 5.700 cm³ e a potência foi mantida em 300 cavalos com os equipamentos anti-poluição que passavam a ser obrigatórios. Mais luxuoso e bem acabado o preço subia para exorbitantes doze mil dólares. Vinha com ar condicionado, radio estéreo, volante com ajuste de altura, freios servo-assistidos, diferencial autobloqueante e rodas cromadas. Havia também a opção do motor mais potente do Corvette com bloco grande e 7.500 cm³.

Em 1975 a Excalibur lançava a série III com mudanças significativas, mas algumas pouco felizes como os para-lamas bem mais largos e com desenho mais aerodinâmico e moderno. Deixou-o com a aparência menos “retrô”. Já podia vir equipado com dois pneus sobressalentes devidamente protegidos por uma cobertura na cor da carroceria. Sobre eles estavam apoiados os retrovisores cromados. Abaixo dos quatro faróis circulares, sendo que os principais eram maiores, vinham quatro buzinas em forma de corneta com acabamento cromado. Os estribos também estavam maiores e com mais frisos. No vidro do para-brisa haviam três limpadores. O carro estava longe de ser discreto.

O motor entrava também na dieta dos demais carros americanos por conta da crise do petróleo. O V8 tinha 5.001 cm³ (94,9 x 88,4 mm) e desenvolvia a potência de 155 cavalos a 4.000 rpm. O torque era de 31,1 mkg.f a 2.400 rpm e sua taxa de compressão era de 8,6:1. O modelo Phaeton media 5,25 metros de comprimento com entre-eixos de 3,17 metros. Seu peso passava a 1.900 quilos. Com este físico e novo motor chegava aos 170 km/h e fazia de 0 a 100 km/h em 15 segundos. O vento batia menos forte no rosto. O painel era todo remodelado com instrumentos circulares e várias teclas. Tudo moderno assim como o pequeno volante de três raios. Este com quatro lugares vendia muito mais que o modelo Roadster que dera origem a companhia sendo ele bem mais esportivo e com desenho mais agradável. Já trazia freios a disco nas quatro rodas e direção assistida. Mas foi um dos períodos em que vendeu mais com um total de 1.141 unidades.

A série IV se iniciava em 1980 com mais mudanças ainda mais extravagantes. Os para-lamas cresciam e estavam mais envolventes. Podiam vir em cor diferente do corpo principal da carroceria. Tanto o modelo Roadster quanto o Phaeton contavam com um pequeno porta-malas.

O grande para-choque cromado tinha três níveis de barras, podia receber capota rígida nas duas configurações de carroceria e o pára-brisa agora em duas peças estava inclinado. Estava agressivo e um tanto desproporcional. Não faltavam concorrentes em território americano. A Califórnia Custom Coach e Southeastern baseada em Indianápolis produzia o Elegant inspirado no Auburn e outro no famoso Cord. Também usavam motores V8 Chevrolet ou Ford. Outra em Wisconsin era a Elite Heritage que se inspirou no Duesenberg e usava os propulsores do Lincoln da Ford.

Por dentro tinha painel em madeira com sete mostradores sendo que o conta-giros e o velocímetro eram maiores.

A lista de famosos crescia com o cantor Rod Stewart, o príncipe monegasco Rainier e o então ator Arnold Schwarzenegger

Em 1985 para celebrar os vinte anos de produção 50 carros foram produzidos nas cores cinza e preto, muitos cromados e uma placa com a assinatura dos irmãos Stevens. Por dentro muito luxo e couro Connolly como nos Rolls-Royce. Começava também este ano a série V e uma versão pouco discreta que tinha quatro portas, teto fixo chamada Excalibur Touring-sedan. Todos os vidros eram planos e grandes dando maior visibilidade e esta limusine. Uma versão ainda mais luxuosa ainda foi batizada como Caesars Palace Special Edition e era equipada com o motor Chevrolet com 350 polegadas cúbicas fornecendo 300 cavalos de potência.

Nesta ultima fase da empresa eram fornecidas seis tipos de carroceria, Era a Roadster, o Phaeton, a Royal, o Limited, o sedã e a limusine. Esta chegava em uma de suas versões a ter quatro vidros laterais e perto de oito metros de comprimento.

Ao todo foram produzidos 3.166 exemplares entre 1965 e 1989. Foi uma pioneira em réplicas muito bem feitas e fiéis no começo da produção. Houve boa aceitação na Europa também. 

Hoje todas elas são muito bem cotadas independente do ano e da versão. Brook Stevens e seus funcionários fizeram um belo trabalho.

 

Texto e montagem Francis Castaings. Demais fotos de divulgação

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